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Do estádio a casa: Paixão vista da própria janela

Como é viver perto de um Estádio de Futebol?

O cheiro a pipocas, a foguete, a fumos, o cheiro a relva, os gritos, as conversas, os sorrisos, os saltos: tudo isto são coisas que começamos a sentir mal nos aproximamos de um estádio de futebol. Um estádio de futebol serve para muito, para o mais simples que é ver um jogo, para reencontros, para pôr a conversa em dia, para festejar… mas, acima de tudo, serve de casa a um clube de futebol.

Uma zona residencial que tenha um estádio de futebol é uma zona residencial diferente. Aqui falamos sobre pessoas que moram perto de estádios, que vivem o clube da sua zona de uma forma diferente da que vivem todos os outros.

Olhemos para o caso de Dina Fabião que viveu desde que nasceu perto do Estádio José Santos Pinto, casa do Sporting da Covilhã, clube que atualmente milita na segunda divisão do futebol português. Dina, covilhanense de gema e enfermeira de 52 anos, conta-nos que viver perto daquele histórico estádio e ir ao futebol “esteve inerente ao meu crescimento, durante anos fui com o meu pai ver a bola porque vivia numa casa apenas separada do estádio por uma estrada de uma faixa”.

É sobre estas pessoas que nos debruçamos aqui, com casas perto de estádios de futebol. E se há muito o estigma de que viver perto de sítios com muita afluência de público é mau, será que os estádios também pertencem a esse grupo ou algo que mexe tanto com emoções, algo tão especial como a casa de um clube de futebol, pode ser um atrativo para morar numa certa zona?

É verdade que nem tudo é bom, um estádio acarreta coisas menos boas, Dina Fabião diz-nos ainda que em dia de jogo “as pessoas com mais idade queixavam-se do barulho e do lixo que ficava por ali espalhado” mas que os mais jovens não se importavam com isso, isto porque o estádio a fez “sempre gostar daquela zona. Os treinos semanais e a dinâmica diária não causavam grande perturbação no nosso dia a dia. Muitas vezes o estádio também era utilizado para festas e romarias, como as marchas populares ou concertos de filarmónicas e era engraçado”.

Este artigo foca-se na experiência de viver perto de estádios de clubes mais pequenos, clubes intimamente ligados às pessoas do bairro/zona a que pertencem. Vejamos o exemplo de João Martins, trabalhador na área de marketing de 26 anos e um apaixonado por futebol, que vive na Reboleira a 550 metros do estádio do histórico Estrela da Amadora. Para João, nos dias de jogo sente-se uma “sensação de comunidade que num dia normal é impossível sentir-se. Nesse dia todos são vermelho, verde e branco. Os bares e cafés nas imediações enchem-se de adeptos até à hora de jogo. No fundo, o termo “clube de bairro” ganha um novo significado quando o Estrela joga”.

Ainda em conversa com o João perguntamos se achava que o estádio trouxe valor imobiliário à zona onde mora… Parece que os prédios onde o João vive são novos, construídos de raíz perto do estádio, prédios recentes com construção moderna, que mostra um projeto da autarquia da Amadora para levar pessoas a viver ao pé do Estádio José Gomes (estádio do Estrela da Amadora). Para além disso, João falou-nos de algo muito interessante, “tem-se assistido a um crescimento do Estrela nos últimos 6/7 anos. Coincidência ou não, tem havido uma recuperação económica do concelho da Amadora, no período homólogo”. Aqui está o que um estádio pode trazer a um bairro/zona, crescimento económico aliado ao crescimento do clube.

Continuamos na zona de Lisboa, viajamos até à histórica zona de Belém onde está o Estádio do Restelo. José Maltez, estudante de Direito de 25 anos que já praticou rugby no clube “Os Belenenses” (clube cuja casa é o Estádio do Restelo) vive com vista para o estádio do Restelo, um estádio que já foi de um dos maiores clubes de Portugal mas que os últimos acontecimentos entre SAD e clube fizeram com que este estádio possa estar em risco de demolição por já não receber jogos da primeira liga e ser demasiado grande para uma equipa que está nas divisões distritais. José conta-nos que “sempre que é dia de jogo, tanto eu como as pessoas que vivem comigo ficamos à janela a observar as pessoas que se deslocam ao estádio”, uma tradição que representa bem a movimentação de pessoas junto a estádios de futebol, uma movimentação boa e benéfica para a zona em que vive; para José Maltez, “é engraçado, para mim, ver os adeptos dos diferentes clubes do país e da cidade aparecerem aqui na zona, com os seus cânticos, as suas bandeiras e as suas cores”. Esta vida que um estádio traz a uma zona residencial pode contrastar com barulho e/ou lixo nessa zona.

Durante as entrevistas, alguns dos entrevistados mencionaram esses pontos, mas na realidade sempre disseram que era uma coisa superável, ultrapassável, que os benefícios de ter o estádio à porta superam essas coisas menos boas.

vista para o Estádio do Restelo da casa de José Maltez

Vista para o Estádio do Restelo da casa de José Maltez

José Maltez contou ao Imovirtual como a zona do Restelo se desenvolveu ao redor do estádio, “o estádio está completamente enquadrado na paisagem da zona, que, aliás, se desenvolveu um pouco ao seu redor. O estádio faz parte da vista da minha casa, da minha infância, e já lá vivi momentos muito bons, quer enquanto adepto de futebol, quer enquanto jovem morador da zona.”

Do Restelo viajamos até à margem sul do rio Tejo, mais precisamente até ao Seixal, casa do Amora Futebol Clube. Tomás Vivas, analista financeiro de 26 anos, morador daquela zona, fala-nos sobre os benefícios de viver junto aquele estádio. Tomás consegue ver “o estádio principal da janela do meu quarto, só ficando escondida uma das balizas. Os campos de treino e dos escalões jovens é que são totalmente abertos”, isto permitiu-lhe viver toda a vida com uma forte ligação ao clube: “para ir treinar dá mais jeito, principalmente enquanto somos miúdos”, outra das valências de viver perto de um estádio que tenha escalões de formação é mesmo esta, a da possibilidade de crianças e jovens praticarem desporto perto de casa, sem terem que perder muito tempo em deslocações, deslocações essas que podem ser causa de desistência da prática de desporto, algo tão fundamental para o crescimento saudável de crianças e jovens.

vista para o campo de treinos do Amora F.C da casa de Tomás Vivas

Vista para o campo de treinos do Amora F.C da casa de Tomás Vivas

Por último, viajamos até perto de Vila Nova de Gaia. Falamos com Cristiano Santos, ex-atleta de futebol do clube do bairro e que agora trabalha em produção de eventos na área do gaming e sports, que vive muito perto do estádio do Sport Clube Dragões Sandinenses, um pequeno clube perto do Centro de Estágios do Olival, casa de treino e da formação do Futebol Clube do Porto. O Cristiano pega naquilo que o Tomás sobre o valor que um estádio de futebol ao pé de casa pode trazer a casais com crianças, ele diz “penso que para até casais novos, ou com filhos pequenos acaba por ser benéfico, pois podem se este for a sua vontade, inscrever os filhos e acompanhar os filhos aos jogos, o que penso que é muito importante”, mas não se fica por aqui, Cristiano disse também que viver ao lado deste estádio é incrível por vários outros motivos, ele falou de “uma zona bastante pacata, e o estádio acaba por dar mais espaço à vila, não só o estádio, mas tudo que engloba, como o bar, o campo para as camadas jovens … “, tudo traços de dinamismo que um estádio pode trazer a um bairro.

Viver ao pé de um estádio para estas pessoas é algo memorável, ver o clube da terra a jogar ali ao lado do sítio onde se dorme, cresce, e se passa a maior parte do tempo é algo que não se consegue explicar bem. Um dia de jogo é um dia diferente, é um dia de casa diferente, estando em casa estão noutro lugar, com visitas de outros adeptos, outras formas de falar e até outras culturas, ali naquele bairro das mesmas gentes e mesmas vozes e cheiros, o estádio traz novidade, alegria ou como Cristiano nos disse “um dia de jogo é um dia de festa em que toda a gente ia a pé para o estádio e se juntavam a tarde toda no bar do clube à espera do jogo”.

Este é um retrato real que mostra a força que um clube tem e como é bom viver perto do clube que se ama.

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Ultima actualização: 19 agosto 2021
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